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Papo de Futuro desta terça dia 04/04 destaca "O que o Brasil deve fazer para dominar o processo produtivo do coração da economia digital, a indústria de semicondutores?"
01/04/2023 16:18 em Atrações

O Programa vai ao ar todas as terças as 06h45min

Entre os asiáticos e os americanos, que esforço o Brasil deve fazer para dominar o processo produtivo do coração da economia digital, a indústria de semicondutores?

Existe um componente que a gente não enxerga, não sente cheiro, não toca, mas que não podemos mais viver sem ele. Assim como o ar que respiramos, só damos pela falta dele quando dá problema: ou você derrama suco no computador, como aconteceu comigo, ou o celular cai no chão e quebra. Eu estou falando dos microprocessadores, ou circuitos integrados, um assunto que importa para todo mundo, mas que pouca gente entende.

Na verdade, essa é uma indústria que está presente em praticamente tudo que fazemos hoje em dia, do automóvel até os objetos inteligentes, como uma geladeira. Da agricultura ao reconhecimento facial no aeroporto. Dos sistemas de vigilância até o seu smartphone ou a TV Digital. Eu trago este assunto porque conversei com o Francisco Giacomini Soares, vice-presidente de Relações Governamentais para América Latina da Qualcomm. E confesso que a conversa não foi muito animadora. A Qualcomm é uma empresa estadunidense que produz chipsets de smartphones, proprietária da marca Snapdragon.

O mundo é cada vez mais dependente da indústria de microprocessadores. Trata-se de uma indústria cada vez mais concentrada, complexa e dinâmica. Ela requer recursos vultuosos e constantes, além de uma política de proteção industrial, para manter bem guardada a sua tecnologia de ponta e preservar a sua força de trabalho. E, por fim, parcerias internacionais, uma disputa por soberania tecnológica e um investimento pesado em mão de obra, para evitar a fuga de cérebros, uma nova modalidade de disputa pela inteligência no mundo globalizado em que você atrai os cientistas mais renomados.

Em resumo, o Brasil não tem nenhuma dessas características, quando falamos de perfil de investimentos na área de Ciência e Tecnologia, como é o caso. Muito pelo contrário, a guerra mais recente que vivemos na área cientifica no Brasil foi para evitar os sucessivos contingenciamentos nos recursos dos fundos de apoio às atividades de ciência e tecnologia, ou seja, o bloqueio ou mesmo a retirada dos recursos para outro setor, como os cientistas reclamaram da chamada Medida Provisória da Sucata, que transferia recursos de pesquisa para custear o descarte de caminhões.

Note que eu não disse que o Brasil não tem infraestrutura científica, nem disse que o Brasil não tem uma política pública ou legislação aplicada.

Então, o que falta ao Brasil para podermos alavancar também a nossa indústria de semicondutores, já que isso é hoje o DNA da indústria digital, e não estamos falando apenas de qualquer microchip ou semicondutores básicos, mas de tecnologia de ponta?

Giacomini me disse que essa é uma briga de gente grande e que o processo é longo, dispendioso, custa caro e de longo prazo, exige pelo menos dez anos para País começar a aparecer no mercado, que hoje é dominado pelos Estados Unidos, que foi o berço da indústria de semicondutores e ainda respondem por mais de 50% dos negócios mundiais. Vamos ouvir Giacomini sobre a nossa realidade:

“Ter autonomia na cadeia de semicondutores. O Brasil pode ter esse processo. Pode, mas vamos ter política e recursos para fazer isso. Vou dar só um exemplo do que está ocorrendo em outros países. Quanto os Estados Unidos vão investir agora em semicondutores? 50 bilhões de dólares. É um PIB. Temos que ser inteligentes. A gente pode fazer isso por parte. A gente precisa ser racional e saber o recurso que a gente tem e que caixinha da cadeia de valores a gente pode melhorar. Esse é o primeiro passo para gente se tornar, um dia, independente em semicondutores.”

A indústria de semicondutores no Brasil tem o apoio da Lei de Informática e do Padis, programa que ajuda na parte dos testes de encapsulamento, segundo Francisco Giacomini.

O Programa de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Indústria de Semicondutores, Padis, usa a fórmula dos incentivos fiscais e tributários positivos para injetar recursos nesta indústria, que envolve escalas micrométricas e nanométricas.

Um estudo bastante antigo do BNDES, de 2003, citado no documento “Plano de Ação: Produção de Componentes semicondutores no Brasil”, de dezembro de 2021, indicou que não bastam recursos financeiros, mas que é necessário também a difusão de uma imagem positiva do país, a implantação de um polo tecnológico para a indústria de circuitos integrados, logística, ou seja, infraestrutura de transportes, de telecomunicações e de serviços públicos.

O Brasil estagnou ou recuou neste campo?

Por exemplo, recentemente, em 2020, O Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada S.A. (Ceitec), empresa pública de Porto Alegre responsável pela fabricação de semicondutores mais básicos para veículos, teve sua liquidação anunciada, processo que agora deve ser revertido, segundo as notícias recentes publicadas na mídia.

Segundo o vice-presidente de Relações Governamentais da Qualcomm, apesar de todas as dificuldades, o Brasil não deve desistir de trilhar esse caminho sozinho:

“Semicondutor, superimportante. Política para semicondutor, todo pais deveria ter. Mas vamos devagar, não adianta agora acha que de uma hora para outra você vai resolver o problema da eficiência que você tem no seu pais e vai passar no dia seguinte a ser um provedor de semicondutor.”

Conforme o estudo que eu citei, dados da Associação Brasileira da Indústria de Semicondutores (ABISEMI), indicam que o setor fatura no Brasil mais de R$ 3 bilhões por ano e gera mais de 2.500 empregos qualificados. Os investimentos em infraestrutura fabril foram de cerca de US$ 2,5 bilhões e de mais de US$ 100 milhões em atividades de PD&I.

O que a gente observa hoje nesta área?

Conforme o Podcast Tecnopolítica, sobre a guerra dos semicondutores, algumas curiosidades se destacam nessa nova realidade em que os circuitos integrados fazem a mediação da vida cotidiana:

  1. A china é um grande mercado consumidor, ao contrário do que muita gente pensa. Ela importa mais de 350 bilhões de dólares nesta área e não conseguiu ainda produzir nem 15% do que consome, e está longe de chegar aos 40% de produção doméstica, como deseja;
  2. Taiwan é responsável por 27% dessa indústria e os chips funcionam como escudos protetores contra uma invasão de outros países, pois os Estados Unidos também dependem de Taiwan.
  3. As tecnologias dos circuitos integrados são estratégicas do ponto de vista militar, por isso, os Estados Unidos fazem um esforço enorme para reinternalizar a sua indústria, pois ela permite defender-se contra guerras cibernéticas, ou seja, uso de tecnologias assim para espionagem internacional;
  4. A chamada guerra dos semicondutores se acentua a chegada do 5G e da Internet das Coisas, a chamada IoT, razão pela qual a empresa chinesa Huawei, uma das maiores fabricantes de equipamentos de telecomunicações do mundo, tem enfrentado restrições em diversos países, como a Inglaterra e o próprio Estados Unidos.

Segundo a pesquisadora Esther Majerowicz, doutora em Ciências Econômicas pela Université Paris 13, na França, ouvida pela Podcast Tecnopolítica, outro fenômeno recente, que são cidades inteligentes, tem chamado a atenção por enfatizarem a política de vigilância das cidades por câmeras. Ela conta que as smart cities podem ser um duto de entrada da vigilância governamental dos cidadãos, e por isso elas são acompanhadas de perto por um comitê no congresso dos Estados Unidos, que acompanha de perto tudo que acontece na China, por exemplo.

Portanto, da crise de semicondutores durante a Pandemia de Covid em 2020, até a guerra entre Estados Unidos e China pelo mercado de semicondutores, tendo como pano de fundo Taiwan, Coreia do Sul e Japão, o Brasil nem consegue fazer cócegas nessa área. Mas Giacominni diz que o país pode começar pelos desenhos (design) de novos chips, mas alerta que isso só vai funcionar se o governo fizer a sua parte.

Acho que antes dos chips, a gente precisa priorizar a ciência como um todo. Esse é o desafio que os cientistas vêm perseguindo há anos.

Comentário – Beth Veloso

Apresentação – Marcio Achilles Sardi

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